sábado, 22 de outubro de 2011

Não existe amor em ésse-pê ...


Tony fuckin' Montana

Passo pelo hall e o porteiro entrega o embrulho. “Agora que acabou a greve, tá chegando pacote aos montes. Assina aqui, por favor.” Garrancho digno de mão direita, que dia é hoje mesmo? “Vinte-e-um, sexta.” Ah, sexta. “Deixo subir direto quando chegar o barbudo, dona?” Sou dona não, moço. E 'brigada, mas hoje não tô esperando barbudo nenhum. “Cansada, sei como é.” Meio-sorriso e aceno a caminho do elevador. Cansada de gente, moço. Será que você entende? Dá de tempos em tempos. Mais freqüentemente do que eu gostaria.

Rasgo o embrulho com o dente ainda no elevador, como criança curiosa que sempre serei. Reconheço a letra do bilhete junto à camiseta. Nó no estômago. Acho que preciso de vinho pra ler qualquer coisa que possa vir daí. Mas já tinha dado pra ver o Tony Montana assim de soslaio. Sorrisos. Sorrisos ao cubo, porque lembrar de aniversário sem facebook ou twitter não é qualquer merda não. Lembrar e resolver escrever depois de tanto tempo de silêncio deu uma desmontada na armadura mandaquiana.

Só eu sei o quanto tentei me apaixonar por ti, guri. Quis muito. Muito mesmo. Tu merecias. Na teoria seria perfeito. Eu merecia. Enterrei dois amores em seis meses e ansiava demais por virar a página. Mas na prática não funciona assim, né. E sou chata, já lhe disse. Me apaixono quase nunca. Porque quando vem é de foder, dá até medo. E sou estranha, já lhe disse. Não me vejo casada e com filhos daqui a cinco anos. Talvez nunca. Intuiçãozinha diz que não vou “sossegar” com ninguém não. E tudo bem. Anda cada vez mais okay esse negócio de viver “lances”. Minor lances. Só que contigo não dava pra ser minor, né. Não seria justo. Então entendo distância. Entendo silêncio. Mesmo.

Eu sou você. Com os dois lá de cima. Já fiz papelzinho ridículo e tudo. Então entendo mesmo. E acho que vou me desculpar até o fim dos dias. E o carinho vai continuar sendo major até o fim dos dias. Fuckin’ huge. Se um dia achar que der, volta. Do jeito que conseguir. Vou achar lindo. Fuckin’ beautiful. Mesmo sendo bastante improvável.

Lembra quando você disse que seu maior medo era não conseguir mais gostar tanto de alguém?
O meu é o de conseguir, e ter de enterrar de novo.

"Aqui ninguém vai pro céu", babe.

domingo, 9 de outubro de 2011

26 ...

(Ou "What matters most is how well you walk through the fire".)


Imunidade de 01. Paladar de 13. Tamanho de 15. Cara de 18. Cinismo de 30. Fígado de 35.
Manias e reclamações de tiazona. Sarcasmo de quem vai pro inferno. TPM de quem já tá lá.
Choro tal criança de 05. Saudade qual senhorzinho de 80.

Fobia social e ansiedade que talvez precisassem de remédio. Teimosia e ceticismo que rejeitam a teoria do remédio.

Vícios novos de 02 em 02 anos. Paixões de foder com a vida de 05 em 05. Planos de viagens megalomaníacas anualmente.

Angustiazinha e questionamentos quase sempre. Felicidade vezenquando.

A melhor parte é ir virando Pretorian fighter.
:Enterrando idealizações. Entendendo que vai ser turbulento, que vai ser caótico, que vai ser vezenquando. E hey, é okay que seja assim.



(CB, Bone Palace Ballet: New Poems)

sábado, 1 de outubro de 2011

You are all diseased ...


(Vídeo de linchamento e incineração públicos, fácil de assistir não.)

Soco no estômago, né. Chegou pra mim por um dos tumblrs.
Eu não sei se ele era gay, assassino, ladrão, estuprador, “rebelde”, you-name-it. Mas sei que há milhares de vídeos desse tipo pela internet. Nos tais sites auto-intitulados macabros-mórbidos. Registros feitos em diferentes lugares. América, África, Europa, you-name-it-again.

Vezenquando alguma das barbáries acaba ganhando notoriedade. E chove indignação e comentários que vão de que-horror-como-um-ser-humano-pode-fazer-isso a ainda-bem-que-onde-moro-não-é-essa-selvageria-de-sociedade.
Aí pra mim é que acaba com tudo. Esse negócio de rotular e jogar pra longe. “Atitude de selvagens-primitivos que ainda vivem em aldeias”. “Muito distante de mim e da minha realidade de país civilizado”. Alguns até arriscam comentários sobre como os linchadores cruéis mereciam violência análoga, “pra sentir na própria pele”. Ou idéias de neo-neocolonização com doutrinação de leis e valores, “pra pacificar e garantir direitos humanos”. Ironia define.

A gente – espécie humana – faz isso com freqüência com o que não consegue digerir muito bem. Rotulamos como algo pontual, distante, passado; escolhemos um punhado de “culpados” pra demonizar, e fim. Passamos a contar a história como acontecimento de recorte muito específico que ocorreu perante circunstâncias muito singulares; que não ocorreria conosco- pessoas normais e de bem - ou pelos menos, não ocorreria novamente.

Holocausto é um belo exemplo. Maldito Hitler demoníaco, que aliado a algumas dezenas de doentes comandou (sozinhos?!) dos maiores massacres da história da humanidade com requintes de crueldade. “Que absurdo, me dá nojo, como alemães concordaram com isso, Tarantino lavou minha alma queimando os filhos-da-puta no teatro”.

Então que entra o porquê d’eu achar o filme “A onda” genial. Ele tenta desenhar o que a gente joga pra debaixo do tapete. Que “boas-intenções”, ideais, e valores podem causar cegueira-intolerância-crueldade. Que a gente é mais primitivo do que gosta de acreditar, só precisa do gatilho pra selvageria.

Você aí civilizado, do alto da sua integridade e solidariedade humanas, que aponta o dedo pra toda essa violência extrema, defensor dos valores de família e tradição, se acha muito diferente dos caras do vídeo?
Lógico que linchamento-incineração-decapitação-estupro é dos extremos escancarado pra revirar entranhas. Mas eu, particulamente, não nos acho tão diferentes dos caras do vídeo no quesito intolerância.
 
A gente espanca gay na Paulista, acha que estuprador tem que virar "mulherzinha"(!!) na cadeia, considera okay polícia entrar na universidade e bater em aluninho-maconheiro-vagabundo-que-faz-greve, faz campanha política tipo a de 1989 (2010 teve quê de terrorismo ideológico também), demoniza comunistas-comedores-de-criancinhas até hoje.
A gente sai na porrada porque fulano torce p’rum time de futebol diferente do nosso, faz festa porque mataram o Bin Laden, vai pra porta do fórum soltar fogos e atirar objetos no pai que atirou a filha pela janela, transforma Capitão Nascimento em herói nacional.
Guardadas devidas proporções, a gente lincha moralmente a menina que curte dar uma temperada na genitália, a gente impede que pessoas se casem ou se submetam a um tipo de procedimento médico porque elas acreditam em valores diferentes dos nossos. A gente não só quer impedir e proibir, como acha por bem criminalizar esse valor diferente.

Não é tão longe, percebe?! Na verdade, pra chegar no incineramento público e no Holocausto é só um passo e uma conjuntura político-social que de tempos em tempos surge. A idéia, a cegueira, a intolerância, a selvageria já existe(m).

Acho importante pensar nisso toda vez que o novo vídeo cruel do momento aparecer nos seus feeds. Acho importante você continuar se indignando e se aterrorizando com as cenas. Acho importante você achar que quer ser diferente das pessoas do vídeo. Então trabalhe pra que seja, em todas as instâncias. Sem jogar o seu pra debaixo do tapete, sem hipocrisia.